AS MAÇÃS À BEIRA DO CAMINHO


Depois de tudo e como derradeiro ato, obrigo-me a chegar ao alto do meu esforço, desta colina pessoal. Com as mãos sobre o joelho, curvo-me ao cansaço. O peso da mochila me joga de joelho sobre a terra batida de tanto pisar. O bastão, fiel amigo, mais uma vez é o apoio para as dificuldades. Ás vezes eu sinto as horas passar no segundo de cada olhar. O sol do norte é mais quente nas horas mais impróprias. Não há água no cantil, os grãos secos já não são a minha reserva de vitalidade. Cheguei ao fim de mim mesmo. Devo me dar o alento do descanso.
- Só mais um metro eu pensei.

Para além desta subida, desta curva, havia mais uma subida em curva. Aquilo que parecia ser o fim era simplesmente o inicio de mais um esforço.
- Vamos para mais uma, disse ao fiel amigo. Mas o caminho tem sua própria metodologia de nos ensinar.

Ali, no meio daquele pequeno planalto perdido, estava uma macieira, a macieira dos meus sonhos. Como se estivesse saída de um caderno de desenho. Folhagem verde, frutas vermelhas e simetricamente redondas. Sombra depois de 5 horas e vários quilômetros de passos progressivamente lentos.
- É ali que me deito.

Por um lapso de tempo imensurável tudo parou na materialização da ausência de nuvens. Sem vento. Sem barulho. Sem nada de concreto, somente eu e a macieira. Sob o efeito letárgico do cansaço, adormeço. O relaxante ocio só é interrompido pelo som oco da queda de uma maça. Como se colocada fosse ao meu lado, era a maça mais bonita que já tinha visto. Vermelha e com um brilho digno de magia.

Aquilo que havia sentido na subida antes da curva se desvanecera quando da primeira dentada ruidosa na maça. Degustei cada mordida, cada mascar, cada deglutir daquela benfazeja maça. Na minha cabeça analisava os efeitos entorpecentes do líquido açucarado.

Refeito me pus de pé e pronto para partir, olhei para a macieira. Santa Macieira do Caminho. Curvei-me perante aquela dádiva divina e numa singela oração agradeci, simplesmente disse - Obrigado! Por que nada mais poderia dizer.

Não sei onde estava, de quem era o terreno, quem a plantara. Agradeci, pois só poderia agradecer aquela única maça que me foi dada sem pedir. Virei-me, relutando em olhar para trás. Estaria eu a sonhar andando, feito um albatroz que dorme enquanto voa? Mas ela era real. Ainda tenho no bolso a única semente que ela guardava, para me lembrar em agradecer sempre as maças que me dão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário, obrigado.

GOSTO DE ...

  • Caminhar com o intuito de esquecer
  • Cozinhar para satisfazer, eu e outros
  • Filmes por que me isolam da realidade
  • Fotografar pois me ajudam a lembrar da vida
  • Livros por que ensinam a valorizar o momento