PASSAGEM

Li uma crônica de uma cara amiga sobre a morte do seu pai.

Lembrei da passagem que o Sensei Confúcio usou para representar a vida: quando nascemos, nós choramos e a nossa volta todos estão alegre e sorriem. Devemos passar a vida de maneira que ao morrer, estejamos felizes com o semblante sorridente, enquanto a nossa volta as pessoas chorem pela nossa partida.

Não me senti aflito pela morte do meu pai, por que vi que o mestre estava certo e meu pai tinha realizado o que ele havia predito.

Era certa sua partida, é claro, todos iremos morrer. É inevitável e inegável. Nisto, eu sei, sou bem materialista. O caminho trilhado tem a catarse no precipício de nós mesmos. Não adianta fugir, espernear, que não tem volta. Nenhum sonho de bens materiais vai nos tirar deste objetivo. Nenhuma manipulação favorável do destino irá nos desviar nem evitar atingir essa meta.

Ainda causa estranheza o fato dele ter procurar o próprio precipício. Não que ele tenha ido as via de fato. Foi o descaso com a saúde que o levou. Ele tão regrado e disciplinador com relação a tratamentos, receituário e aplicação de remédio. A idade pode ter sido um fator, mas a displicência para com o tratamento e a soberba com que encarava as suas próprias enfermidades foram determinantes para o final das contas. Quando o retorno já era impossível nada mais tinha que fazer se não se resignar.

Não quis vê-lo enquanto estava na UTI. Não quis guardar a imagem dele deitado na cama, com aparelhos. Preferir conservar a imagem dele em casa, semanas antes de ir para o hospital. No velório, não contemplei meu pai como morto. Tinha a nítida impressão que ele estava dormindo, como sempre fazia na sala, “assistindo televisão”. Depois, o féretro saiu lentamente pelas mãos dos parentes, amigos e conhecidos para o seu descanso. Seu, por que foi escolhido por ele. Perto do lago, junto dos gansos e patos e próximo ao barranco onde poderia pescar, assim que fosse permitido tal façanha. Ele esta lá pescando, eu sei. Vez ou outra visitamo-lo com o intuito de ornar a lapide, orar e “conversar”.

Acredito que tenha se cumprido o ditame do sensei, partiu calmo e feliz.

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